quinta-feira, dezembro 25, 2008

Despedidas

"Que beleza é conhecer o desencanto/ E ver tudo bem mais claro no escuro"
(Imunização racional - que beleza: Tim Maia)

Termino o ano com a cabeça cheia e o coração vazio. Pedindo arrego. Pedindo água. Pedindo descanso. Profundo.
Vou fechando para balanço. Colocando meus sentimentos em promoção (Queima de estoque?).
Eu me embrulho com fitas vermelhas, para esperar ninguém.
Só quero estar só, em baixo de uma árvore.

Termino o ano com pensamentos simples. Com verdades imperfeitas. E sem conclusões. Só quero um bom café e um pedacinho de chocolate para recuperar o equilíbrio. Quero seguir. E seguir. Em cima da minha bicicleta. Amando o vento que me refresca o rosto, a alma e me leva os pensamentos.

Termino o ano suando, dançando e correndo. Prometendo que levanto as seis da manhã no dia seguinte, só para fazer tudo o que gostaria. Mas durmo tarde. Então eu compro frutas, por uma vida mais saudável. E acho que está tudo certo enquanto abro uma cerveja, Nina Simone arrebenta no rádio e eu faço alguma invenção culinária para mim mesma.

Termino o ano, sem colocar a felicidade no passado, ou no futuro. É um erro muito grande não viver de verdade o presente. E me dou esse presente.

Termino o ano com os planos deixados de lado. Abandonados nos rascunhos em algum caderno velho qualquer.
Cultivo apenas as esperanças. Aquelas que deixo brotando na sacada do solitário 8º andar do meu mundo.

terça-feira, dezembro 02, 2008

Invenção

"Levando em frente um coração dependente, viciado em amar errado. Crente que o que ele sente é sagrado. E é tudo piada." (Carente Profissional, Cazuza)


Não. Não se preocupe. A verdade é que nem te amo tanto assim.
E, se ainda chegam mensagens apaixonadas no seu celular, ali, em plena madrugada, é porque meu coração já se embriagou com muitas cervejas. E coração de bêbado... Bom, você sabe... Precisa de um amor desesperadamente. Ainda que barato e rasteiro.
O meu coração, que não é menos patético que o de ninguém, não sabe fazer diferente.
Não. Não te amo tanto assim. E se sinto a sua falta é apenas para cobrir com saudade uma melancolia qualquer de um final de domingo. Gosto de te reinventar nessas horas e fico ali colorindo o que sempre foi preto e branco. Te digo até, que é um dos meus passa tempos favoritos.
E se te escrevo, bom... É porque preciso de poesia. E você ali, sentado sobre o meu passado, sempre sorrindo, inevitavelmente me preenche com alguma inspiração. Ainda que tosca. Como um roteiro de novela das oito.
Por isso te deixo ali, jogando cartas com a minha carência. Finjo inclusive que isso pode até me doer. E gosto de interpretar algum drama. O amor inatingível é sempre mais gostoso.
Mas não te amo. Quero às vezes até me entregar para alguma saudade no fundo da alma, mas já não sinto nada. Só uma espécie de torpor que me deixa anestesiada por horas, até eu me convencer que sinto saudades de ter saudades de amar você.
Passo pela banca de flores da Dr. Arnaldo e faço um imenso esforço para me lembrar de você. Esses dias até coloquei um lembrete na tela do computador, para quando eu passasse por lá eu sentisse falta das flores que você me deu. Mas eu passo e só me lembro de me encantar com os girassóis. Os minutos curtos que conduzem meu olhar passam rápido demais. E quando vi, não sofri por você. Sequer te procuro pelas ruas, ou sonho contigo.
Vou aos mesmos lugares que você me levou. Acompanhada até de outros homens e nada, absolutamente nada, me comove.
E por mais que eu tente. (No fundo, eu ainda queria te amar loucamente) fico ali, caçando paixão. Cutucando só para ver se meu coração ainda bate. Ou ressuscita.
E quando canso. Porque fatalmente eu canso. Sinto saudades da coragem que eu tive de inventar um amor tão bonito para você.

domingo, novembro 30, 2008

Aos vinte e seis...

Aos vinte e seis anos você já se tornou intolerante o suficiente para beber cerveja quente no bar da moda.
Aos vinte e seis anos você já sabe que enfrentar uma balada em plena segunda feira pode custar caro durante toda a semana. Mas você ainda insiste em fazer algo do tipo, só para negar que ficar velho e cansado faz parte da brincadeira.
Aos vinte e seis anos, você já sabe que amor e sexo nem sempre dormem na mesma cama. Mas às vezes você se confunde só para ter mais emoção.
Aos vinte e seis anos você sabe que não encontrou o emprego da sua vida, faz cagadas por se achar muito experiente, mas dorme mais tranqüilo por saber que as coisas acontecem com o tempo e necessitam de dedicação.
Aos vinte e seis anos você sabe que o mundo evoluiu muito, mas ainda não inventaram nada tão foda quanto Beattles.
Aos vinte e seis anos você tem muitas dúvidas. E a maior delas é se você já amou realmente alguém na vida.
Aos vinte e seis anos, todo mundo quer ser independente. Mas já sabe que pedir ajuda, muitas vezes, é necessário.
Aos vinte e seis anos a sua liberdade é sonhada no limite do seu salário e baseada em alguma realidade.
Aos vinte e seis anos você já sabe que não vai mudar o mundo, então decide por uma empreitada mais justa, como tentar mudar a si mesmo esperando que isso faça bem ao mundo.
Aos vinte e seis anos, todo mundo tem medo de casar. Mas acredita que o amor deve sempre ocupar planos futuros.
Aos vinte e seis anos você sabe que nada melhor do que um boteco com os amigos para que a vida tenha algum sentido.
Aos vinte e seis anos, você acredita que as coisas que seus pais lhe diziam podem ter mesmo alguma semelhança com aquilo que se identifica como verdade.
Aos vinte e seis anos, você conhece mais de perto as conseqüências. E por essa razão simples, você entende que o futuro não é o melhor lugar para se depositar seus melhores dias. Nem os seus melhores sonhos.

sexta-feira, novembro 07, 2008

Eu mereço

(Tudo azul/ No céu desbotado/ E a alma lavada/ Sem ter onde secar/ Eu corro/ Eu berro/ Nem dopante me dopa/ A vida me endoida/ Eu mereço um lugar ao sol/ Eu mereço... Cazuza – Carente Profissional)

O triângulo soa. O triângulo sua. E a zabumba chama, para que então os corpos tomem a pista e falem por si.
Não é preciso palavras. Só é preciso um pouco de cerveja gelada, para evitar que o corpo derreta por inteiro. E nesse espetáculo de sinais, meus pés correspondem, celebrando um maravilhoso frenesi.
Eu rodopio. Eu danço. Eu faço. Passo de braço em braço, mas não paro de rodar em mim. E assim mesmo, eu me refaço e me desfaço, em um mesmo compasso. Já não tenho mais saudades de ti. (E sequer preciso.)
Minha vontade é apenas de me entregar a vida que pulsa lá fora. Por que regar com lágrimas aquilo que morre aqui dentro?
Talvez a vida só precise de uma sapatilha com solas de plástico, para que possa escorregar de maneira vadia por uma noite sem estrelas.
O resto é aquilo que a gente se deixa merecer.

domingo, outubro 26, 2008

Na terceira pessoa. Do singular.

“Não se deve confiar nas pessoas que tem medo da solidão, pois elas, na verdade, nunca estão realmente sós. Usam de vários expedientes para preencher com homens, mulheres ou álcool o vazio da sua imaginação. Ignoram que, na verdade, a solidão não pode ser preenchida. Ela não tem fundo. De nada serve fugir dela. A solidão é um amante que precisa que lhe sejamos infiéis.”
(Martin Page – A gente se acostuma com o fim do mundo)



Virou a chave e sentiu um leve arrepio sobre a espinha. Decidiu então pisar com cuidado para que o choque não tão fosse doloroso. Sentia medo do que iria encontrar.
A falta de hábito lhe trazia um grande desconforto. Mas não encontrou nada além da bagunça que se acumulara durante a semana. E a bagunça lhe era familiar, já que se assemelhava ao que tinha dentro de si.
Há tempos que a vida não parava para que uma sexta feira fosse enfim um lugar comum em seu cotidiano. Silenciosa, vazia e banal.

Tirou os sapatos. Passeou com os dedos pela agenda do celular, procurando algum sentido. Poderia acabar com aquele silêncio em um toque, mas não queria. Queria ir ao encontro do seu silêncio, até que nele, finalmente encontrasse paz.
Deixou os papéis trazidos do escritório sob o sofá. Caso a solidão se tornasse assustadora, chamaria o trabalho para entorpecer a cabeça. E o cérebro ocupado já era o suficiente para não sentir, embora uma suave letargia, aos poucos, corroesse sua menor vontade por sentir algo.
Em nome do corpo febril, enfiou guela a baixo um coquetel de anti gripais. Não tinha muitas forças para brigar com os estímulos lentos de seu corpo. Que os remédios se encarregassem dessa guerra.

No canto da sala, a ferida exposta. A mochila intacta do último amor que havia embarcado. Decidiu que permaneceria ali por mais uns dias, até que a sua falta de coragem cansasse e enfim ela se sentisse determinada a esquecer. Enquanto isso cultivaria o monumento à esperança perdida. E seguraria então as lágrimas. Não valia a pena.

O leite azedo e esquecido no bule. Na geladeira, uma coleção de frios na barriga e mofos. Prateleiras de amores inesquecíveis. Aquele também seria guardado, para depois empoeirar.
Procurou, enfim, nas luzes de São Paulo alguma espécie de contentamento. Algum sonho que a fizesse sorrir. Ao menos momentaneamente. Mas eram só luzes de uma sexta feira quente, onde talvez a maioria das pessoas se refrescasse com um copo de cerveja gelada. Mas ela estava ali e ali ficaria por muito tempo. Vivendo na terceira pessoa. Do singular.

quarta-feira, outubro 01, 2008

A triste história do fim

Nesse caso, aceite o destino e carregue-o com seu peso e sua grandeza, sem nunca se preocupar com a recompensa que possa vir de fora”
(Rainer Maria Hilke)


Carros. Um milhão deles. E a paisagem de faróis inertes acolhia como ninguém a sua tristeza. Pela primeira vez não ligou o rádio para saber qual o melhor caminho. Não procurou novas rotas e não maldisse a sinfonia agonizante das buzinas. Pela primeira vez não desejou estar em outro lugar, senão ali, parada, no trânsito de São Paulo.
A sensação de inércia nunca lhe parecera tão confortável. Talvez fosse a ausência de pressa em revê-lo. Não havia mais nenhuma sombra de ansiedade. De certa forma, não queria aquele encontro, mas sabia, com todas as suas forças que ele era necessário. Para traduzir com poucas palavras o que talvez nunca ninguém diga, ou explique. O final.
Revisitou o fundo da alma buscando encontrar o medo de perdê-lo. Não mais habitava. Saberia que a felicidade de imaginá-lo para sempre lhe parecia mais como uma corrente do que um sonho, dos tantos sonhos que havia construído até então. Tudo ali, parado, desmoronava.
Uma lágrima, duas ou três. Não queria brigar com o trânsito ou com as lembranças. Que deixasse então doer, e que cada uma delas formasse uma linda frase para um epitáfio. Porque brigar com o inevitável? Deixassem as buzinas gritar. Ecoassem dentro de si.
Lembrou então das inúmeras brigas que presenciou ou seu lado no trânsito. Lembrou-se nitidamente da sensação de irritação que sentia. Precisava de raiva também para desconstruí-lo. Os carros parados eram a cena perfeita daquilo que não poderia esquecer. Raiva.
Viu-se então amortecida pela solidão refletida no seu retrovisor. Segurou firme a direção e decidiu então perder a direção e não controlar mais nada. Havia cansado de brigar com seu cansaço. Queria sucumbir a ultima gota de esperança. Não iria mais esperar. Iria permanecer ali por horas, se sentindo impotente.
Até não mais poder.
Segunda, terceira e quarta marcha. Aos poucos os carros começaram a escoar por vias diversas e ela não teve alternativa senão buscar o seu próprio caminho.
Chegando ao seu destino, tremeu. Quando apertou a campainha lhe ascendeu o último e inevitável suspiro. Esperou que ele abrisse a porta de banho recém tomado e, perfumado, lhe desse o abraço de sempre. Esperou que tirasse flores escondidas nas costas, para lhe dizer que era ela quem importava e que poderiam ao menos tentar. Mas a maçaneta girou e ela foi de encontro a sua velha e surrada calça de moletom. Na ausência da vontade e do cuidado, a saudade então abandonou. Sem tentativas. Sem tratativas.
Não era necessário desenhar um ponto final. No final das contas, ele estava ali posto. As palavras eram quase desnecessárias. As lágrimas cobriram os hiatos. A dor ardia diante do destino. E o amor jazia, no meio da sala, duro e cianótico. Atropelado, moído e surrado e cansado.

sexta-feira, maio 23, 2008

Socorro: contrataram a minha bunda!

Hoje é sexta feira. Uma linda sexta feira de sol e céu azul, precedida de um lindo feriado, de sol e céu azul. Nada é mais propício do que, em um dia como hoje, você acordar cedo, feliz, disposta, saltitante, feliz e cheia de vontade para... TRA-BA-LHAR! Sim, trabalhar, como não? Quem teria algo melhor para fazer numa sexta-feira-pós-feriado do que vir trabalhar? É certo que os meus chefes devem ter a resposta, pois nenhum deles veio...
Ai eu estou aqui, indignada diante de tanto egoísmo da parte deles, afinal, eu também gostaria sinceramente de saber o que é melhor para se fazer numa sexta-feira-pós-feriado do que vir trabalhar.
Eu pensei em ir para a praia com meus amigos da faculdade, eu pensei em voltar mais cedo para o interior e ler um livro na rede, eu pensei em lavar roupa e arrumar a casa que há tempos não sabe o que é organização, eu pensei em tomar um sorvete, em ouvir música, em ficar em algum lugar em silêncio, no mais profundo silencio até enjoar.
Mais aí acordei, com o despertador berrando e a minha conclusão óbvia para um dia de sol como esse foi: Querida!!!! Hoje não está um dia perfeito para trabalhar? Óbvio que estava... Peguei meu carro, não peguei trânsito algum e cheguei aqui feliz para dividir o escritório com meia dúzia de moscas. Enfim, encontrei o silêncio que tanto precisava. (Eu fico pensando se existe Deus nesses momentos...)
No meu e-mail, alguma meia dúzia de tarefas e o escritório vazio. Conclui com uma certeza nefasta de que o espírito de equipe corporativo entre eu e as moscas era algo bonito de se presenciar. Você também se solidarizaria, se não tivesse nada mais útil, prazeroso e importante do que vir trabalhar, numa SEXTA-FEIRA-PÓS-FERIADO com o sol e um céu azul, sorrindo ironicamente para você lá fora!

Pois bem, então, antes de pingar o colírio alucinógeno do “foda-se”, vamos à sessão descarrego!

Este é, pelo menos, o quarto lugar em que sinto que contrataram a minha bunda. Explico. Eu me esforcei para fortalecer o meu cérebro, concluindo em uma boa faculdade um curso universitário. No entanto, não obstante tanta leitura e conhecimento acadêmico, sinto que sou aproveitada por um órgão localizado mais abaixo e nada fortalecido no meu caso: o glúteo! Vejo que meus chefes se satisfazem bastante com o fato de eu vir em dias que ninguém vem para sentar a minha bunda nessa cadeira e ficar aqui sorrindo. Como nesses dias meus chefes só usam o telefone para se certificar de que realmente estou aqui, no entanto não demandam absolutamente nada, e, meus clientes obviamente aproveitam o feriado, eu não tenho nada para fazer. No entanto, tenho que vir trabalhar para mostrar a dedicação e comprometimento esperados. Nesses dias, eu confesso: aqueles discursos gloriosos do “espírito em equipe”, do “profissionalismo dinâmico e integrado” e do “vestir a camisa” me embrulham o estômago. E eu respondo com cinismo a máxima por mim identificada: alguém tem que se foder. Então vamos lá, camisa no estômago, bunda na cadeira, sorriso amarelo e umas gotinhas de colírio alucinógeno.
Afinal eu e os mosquitos formamos uma bela equipe!
E num dia como hoje, há um perfeito sentido na sincronia de umas palavras que um barbudinho tonto falava sobre o tal capitalismo: é a porra da mais valia! A porra a mais valia...

segunda-feira, maio 05, 2008

antes de dormir

O relógio revira volta, com as voltas que dou em mim, no meu próprio silêncio: caçando inspiração antes de dormir. Quero evitar meu próprio tempo, insistir na janela até que as luzes de São Paulo se apaguem e me tragam um novo céu azul. Para eu poder inventar uma nova história e esquecer o atraso do ônibus do dia seguinte.
Quero viver a minha própria bagunça, na calada da noite, ainda que isso signifique acordar despenteada e mau humorada de manhã. Ainda que meu céu azul já não me faça mais nenhum efeito.
O relógio revira e volta, quando já não quero voltar para mim. Quando já não quero mais saber dos minutos que me aprisionam. Quando já não posso mais viver só de paixões.
Nessa vida possível, eu queria mesmo é deitar lá naquela cama e cobrir-me toda cotidiana, como se nada fosse o além daquilo que se faz e constrói todo dia. Eu não quero mais todo dia e sequer quero o dia seguinte.
Eu quero que os minutos do relógio parem. Preciso de mais tempo para sonhar.

domingo, abril 27, 2008

Lisa

Um latido rouco e o focinho encostado no sofá. Ela tinha seu jeito único de protestar por carinho e não sossegaria enquanto eu não coçasse sua orelha da forma como gostava, para então amolecer e deitar-se ao meu lado.
E enquanto esse pequeno ritual perdurou, assistimos a muitos filmes bobos na TV, lemos quase uma biblioteca inteira e estudamos para o vestibular. Passeamos pelo parque, condecoramos uma árvore como favorita, batizada em inúmeros jatos de xixi. Tivemos finais de semana incríveis, onde ao final do dia, ela se estendia exausta e arfando, no porta malas do carro do pai, sem ter mais forças para brincar.
Conheceu meus namorados, desaprovou todos e chegou a ficar no meio de um beijo que uma vez fui roubar. Ciumenta. Sempre ciumenta. Ninguém poderia receber mais atenção do que ela e, de fato, ela fazia por merecer.
Mas enquanto ela ficava ali, eu cresci. Saí de casa e ela deixou de ser minha companheira das revoltas chorosas no quarto, dos ímpetos de adolescente, dos passeios no parque. E passamos a nos encontrar aos finais de semana, quando o motor do carro desligava e um latido familiar antecipava uma saudação, que sempre teve o poder de me derreter. Dificilmente eu me encontraria com ela, sem que as minhas calças ficassem sujas de pêlos e baba, mas ainda sim, eu sorriria.
Dos encontros mais engraçados, lembro-me quando de biquíni me estendia ao sol, até que inoportunamente ela aparecia, com um pedaço de trapo qualquer para se deitar ao meu lado. Ela demorava a se convencer de que sua cobertura peluda não era nada propicia a um bronze e quando o calor ficava insuportável, ela se recolhia à sombra com a língua de fora e as orelhas pingando. Mas sempre a espreita me aguardando, até eu levantar.
Teimosa, sempre teimosa. Questionava as regras da casa como ninguém. E mesmo velha não se esqueceu de dormir no sofá proibido, reclamar pela única casquinha da pizza do meu prato, virar toda a sua comida no canil quando era presa injustamente, e, fazer xixi pela casa quando se sentia sozinha. Ela foi capaz de destruir os jardins da minha mãe, sem destruir a sua paciência. Ela foi capaz de trazer pombas mortas para a cozinha e ganhar alguns gritos e umas risadas. Ela foi capaz de tornar o incompreensível latido, em um código que dizia mais do que poderia dizer.
E com o tempo passando, ela foi ganhando pêlos brancos pela cara, se aquietou em um sofá só dela com todos os requintes de um cão idoso.
Um dia então, o motor do carro desligou e nenhum latido me deu boas vindas. Um vazio enorme, que me fez sentir pequena, dizia algo sobre uma nova saudade. Abri a porta sem encontrar o mesmo rabo abanando, suas orelhas se arrastando pelo chão e o uivo que me causava um sorriso.
Eu. Eu que não acredito no céu para homens nem para cães. Eu, que vivi tanto de mim com ela ali do meu lado. Eu, que de uma forma egoísta queria que ela estivesse lá para sempre. Eu...
Soube então, que a partir daquele dia, de fato estaria, com seu jeito único de protestar, mas dessa vez, com focinho encostado no meu coração. E nessas horas eu sentiria muita falta de coçar suas orelhas até ela amolecer e deitar-se ao meu lado.

sexta-feira, abril 18, 2008

Coisas da vida

A verdade é que era muita estrela para pouco céu. Mas eu estava ali, me sentindo pequena e desengonçada, numa tentativa tímida de brilhar. Timidez que não cultivo e me dano.
Estava ali, questionando todos os meus erros, procurando qual a prateleira do supermercado que vende paciência, me perguntando por que o céu na verdade era o caos e não o brilho.
E me deu uma vontade imensa de virar pó.

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Novas borboletas no estômago (eu gosto de gostar de você)

Você. Ainda você. Sem rodeios, nem devaneios. Apenas com o mesmo gosto que gosto. Com o mesmo cheiro que desejo. Com a mesma segurança que sempre me irrita. Lógico e racional como é. Uma linha reta em meio ao meu caos. E eu me perco novamente.
Seu sorriso, e o meu alívio. Imediato e perdido, nos olhos verdes que me acostumei a sonhar.
Você, inteiro você. Com os seus cachos sufocados, sorrindo diante do meu coração costurado, que ainda treme por você.
Então me perco nos seus sentidos, sem sentido, porque gosto mais é de sentir você. E o seu olhar de menino...
Nada dentro de mim agora corre. O que era inquieto tinha jeito de saudades. E agora o silêncio tranqüilo preenche o espaço das nossas mãos. Juntas e bonitinhas. Fazendo inveja aos olhares menos apaixonados.
E contigo estou inteira. A metade que me falta, vira um pedaço de preguiça. Me desfaço no seu beijo e fica tudo bem.
São os risos. O riso que vem fácil, denunciando aquilo que já não sei negar. Que você tem algo que mexe, que vive e que enlouquece dentro de mim. Você tem aquilo que me diverte, que me desafia e as vezes me entristece.
Você tem o que faz ser gostoso gostar de você.
E simplesmente gosto.
Acorde comigo. Todos os dias...

quinta-feira, janeiro 03, 2008

Adeus Helgolândia...

"Quem sabe o príncipe virou um chato, que vive dando no meu saco. Quem sabe a vida é não sonhar"

(Malandragem, Cássia Eller, último volume, passando roupa, momento de histeria e redenção)