segunda-feira, novembro 30, 2009

Aos vinte e sete...

Aos vinte e sete anos eu seguro a vida nos dentes, rangendo-os com força para que meus sonhos não escapem. Não quero deixá-los amadurecendo na lógica mecânica, onde se listam as tarefas, onde se vencem as contas, onde se consomem as horas. Não quero me deixar consumida pelo tempo que não controlo. Apenas vivo de um jeito tão intenso que nem mesmo caibo em mim. Preciso da inconstância do mundo. Me apaixono por ela todos os dias.
Mas aos vinte e sete anos, não me jogo mais em abismos. Chego até a medir as paredes para compreender a profundidade. O resto é prática. Exercício incômodo daquilo que já sei lidar... por isso, admiro mais as surpresas.
Aos vinte e sete me restam as madrugadas para viver o que é incerto. Gosto de me resgatar nesses momentos, em que lamento pelo dia ser terrivelmente finito.
Aos vinte e sete divido meus bons vinhos, com meus bons amigos. E boas conversas com algumas cervejas. Acho que o melhor da vida esta mesmo nesses momentos.
Aos vinte e sete anos eu seguro a vida nos dentes. Acho que é assim que tem que ser. Eu vivo de incertezas certas.

domingo, novembro 22, 2009

Outro lugar

(“Eu, às vezes fico a pensar/Em outra vida ou lugar/ Estou cansado demais/ Eu não tenho tempo de ter/ Nem tempo livre de ser/ De nada ter que fazer/ É quando eu me encontro perdido nas coisas que eu criei/ E eu não sei/ Eu não vejo além da fumaça/ O amor e as coisas livres, coloridas/ Nada poluídas/ Eu acordo pra trabalhar/ Eu durmo pra trabalhar/ Eu corro pra trabalhar” - Capitão da Indústria – Os Paralamas do Sucesso)

Pela janela do avião eu observava as asas rasgarem o céu com violência, chegando quase a tocar os prédios. Os prédios. São tantos que chego a pensar que brotam sem razão, por alguma estranha epidemia. São Paulo é uma cidade doente. Doente de ansiedade. Por isso precisa antecipar o chão. Por isso precisa ter um céu tão apertado.
Mas eu queria espaço. Espaço para voar. Voar em um céu, que fosse ao menos de verdade.
Então, enquanto as asas do avião rasgavam o céu com violência, na mesma violência eu sentia rasgar em mim uma vontade estrangeira de não querer mais voltar. Meus sonhos com a cidade que tanto me deu sonhos, agora se transformavam em ilusão. Estáticos, alguns desses sonhos adormeciam em seu trânsito paralisado. Outros, agora doentes, enlouqueciam na irracionalidade dos meus dias cinzas. São Paulo não me cabia mais, apesar de sua imensidão compactada.
Mas eu amei essa cidade. Um dia cheguei a me casar com ela. E com vontade de resgatar a paixão dos primeiros dias, caminhei pela Avenida Paulista, na ânsia de sentir aquele familiar impulso. Impulso de sonhar com a cidade grande. Impulso de me encantar com as suas possibilidades. Mas não senti nada. Exceto a apatia de quem não distingue mais o luxo do lixo e tudo se mistura. Sem razão. Sem sentido. Caminhei horas sem sentido. Feliz porque a Avenida Paulista é apenas uma reta. Então eu podia seguir em linha reta, quando eu já era apenas curvas. Tortas. Ridiculamente tortas. Estupidamente tortas.
São Paulo é uma cidade estúpida. Como o flanelinha que te cobra 10 reais para “olhar” seu carro. São Paulo é uma cidade grosseira, como a buzina que estoura lancinante pelos míseros 4 segundos que você parou diante de um sinal verde. São Paulo é uma cidade feia como as mulheres esquálidas e plastificadas que transitam pelo Jardins.
São Paulo é uma ilusão e isso tudo não me cabia mais.
E naquela noite eu dormi triste e com as janelas abertas, olhando as luzes insones, esperando encontrar um outro lugar.
Naquela noite eu me senti como quem dorme com um homem que não se ama mais.