sexta-feira, dezembro 25, 2009

Distâncias

(Para o Phil. Pela distância que também nos faz próximos)

O sinal se fecha fazendo com que os carros se amontoem ansiosos ante a faixa de pedestres. Enquanto uma buzina ou outra reclama a pressa, centenas de pessoas invadem as ruas, cheias de sacolas, trombando-se com indiferença e desrespeito. Parecem formigas, levando no lugar das folhas, pacotes.
Apressados esses transeuntes multiplicam-se nas ruas, e, entre uma loja e outra movimentam o frenesi do consumo. O consumo. Parece que tudo é feito para consumir nessa época. Mas eu não compro nenhum sonho de natal. Pelo contrário. Minha paciência anda curta e minha ansiedade eu embrulho para presente. Quero fugir dessa multidão.
Aperto o passo rumo à última estação de metrô da Paulista. Gosto de sentir o cheiro dessa tarde de verão que se põe, juntamente com o sol, atrás dos prédios. São Paulo nessa hora parece até sorrir, ainda que um sorriso tímido que logo se põem, também, atrás dos prédios.
As luzes do dia dão então lugar às pequenas luzes que iluminam a avenida. Pais passeiam com seus filhos diante das alegorias. Eu me irrito com tanta multidão.
Na esperança de que o outro lado da rua esteja mais vazio, espero o sinal abrir, mas não atravesso. Eu simplesmente paro, hipnotizada, diante das luzes que iluminam o Parque Trianon.
Fecho então os olhos, para ter certeza de que guardo na minha memória aquela imagem que me encanta. E escuto então a sua voz familiar.
- Guita, venha ver! Eu consegui acender a árvore do jardim!
Quando corro na agilidade dos meus sete anos para a frente da casa, sorrio diante da surpresa que ficou dias sendo confeccionada no quarto dos fundos. A árvore de luzes, feita com lâmpadas coloridas. Sorriamos satisfeitos, eu e meu avô.
Quando abro os olhos novamente, sinto minhas pálpebras cheias, a ponto de fazer a visão turvar. Uma, duas, três. As lágrimas não demoram a deixar o meu rosto mais fresco do que a noite.
Ainda não atravesso. Quero ficar mais alguns minutos olhando, esperando a mágica passar. Ainda não atravesso, quero vasculhar a outra metade da minha memória, a fim de que outras lembranças boas, fiquem assim, de repente nítidas. Ainda não atravesso, fico do outro lado da rua, de mãos dadas com a saudade.
Mas não consigo. Nenhuma lembrança me presenteia com a mesma nitidez.
Olho então para as luzes e desejo não perder nunca o natal que ele me deixou. Olho para as luzes e agradeço por iluminarem essa distância que nos fez e nos faz sempre, próximos.