domingo, abril 29, 2007

Mãe

Inesperado como tudo o que é sincero, agora me surpreendo com a capacidade de conviver contigo, cotidianamente. E agradeço o seu zelo, de me acolchoar o mundo quando ele acaba de se mostrar um lugar tão pedregoso. E, por isso, levo teu sorriso na bolsa, para aliviar meu desespero.
Você, que sempre me dá um pedaço de chão assim que meu mundo cai. Você que me desaprova com a força mais bruta, me fazendo sentir vergonha de desistir. Você e seus olhos azuis.
Somos diferentes. Como não haveria de ser? Questionamos as nossas felicidades, porque sabemos dos caminhos que nos levam a alegrias divergentes. E insistimos em brigar no café da manhã.
Mas ainda que a crueldade das palavras nos deixe nuas diante de nossas diferenças, eu agradeço, acima de tudo à sua feminilidade. Agradeço ao pedaço de chão que você me empresta, para pisar descalça sobre tudo o que ainda dói. Agradeço ao olhar irascível lançado brutamente para que eu sinta vergonha de ter medo.
Te amo. Te amo como se ama aquilo que lhe é diferente. E contigo aprendo, todo dia, um pouco mais.
Te amo porque contigo aprendi a sonhar, pelo mundo aconchegante que você me ensinou a ter, dentro dos teus olhos.

segunda-feira, abril 16, 2007

Antes de dormir

Por que a gente é tão sozinho?

sexta-feira, abril 06, 2007

Perdão

Ele me olha como um pedaço de carne exposto no açougue, com uma certeza infinita de que meu ódio me conserva ali, eternamente, à sua espera. Esperando pelo dia em que ele trará novamente felicidade à minha vida. Contando com o dia em que ele encontrará a mesma menina, bêbada e suja, ajoelhada aos seus pés, jurando-lhe amor eterno.
Ele me olha com a lembrança de um amor impossível, escarrado, declarado e vivo, ali nas veias do silêncio que sobrou. Ele me olha com a ternura de um sentimento abandonado, com o carinho de um coração quebrado. E ele sente dó.
Não. Ele não suporta a minha felicidade. Não reconhece nos meus olhos nenhum tipo de tranqüilidade. Ele só quer arranhar a cicatriz. Para ver se ainda sangra. Para ver quanto do meu desejo ainda orbita sob o seu ego. Para ver quanto do nada que sobrou. Mas há tempos eu já não estou mais ao seu redor.
E por isso ele invade a minha caixa de e-mails com os seus sentimentos mal resolvidos, arranja o número do meu celular por meio de outros amigos e me procura para dizer “Penso em você”. A que horas? Enquanto você trepa com a sua namorada na madrugada de um sábado qualquer? Ou enquanto você tem uma diarréia em meio a uma reunião de trabalho?
Não, eu não o suporto. Pois vejo nele a mesma arrogância com que olho a menina bêbada e suja implorando por um pouco de amor. Eu o odeio, porque odeio os erros que meu coração comete, quando pulo de cabeça num poço de sentimentos rasos. Eu definho no meu ódio, porque ainda sinto ódio do que fui e daquilo que lhe dei de graça. Eu o afasto, porque quero longe a fantasia de palhaço no teatro dos amores mal resolvidos.
Mas eu o perdôo. Perdôo porque é preciso perdoar a mim mesma e parar de chamar de sua a vergonha que carrego em mim. Perdôo porque com ele aprendi uma das lições mais tristes e doloridas, porém eu sobrevivi. Perdôo porque um dia eu não sabia, que amor nenhum sobrevivia, onde não há amor próprio.

quinta-feira, abril 05, 2007

Eu vou reclamar

Descobri que reclamar é um vício. Um vírus. Uma doença crônica que me ataca os nervos, a paciência e a sanidade. Reclamar é uma fixação. Uma obsessão. Um desperdício gigantesco de energia. Reclamar consome.
Mas ultimamente a única coisa que tenho feito com maestria na minha vida é justamente reclamar. Reclamo de tudo. Reclamo do Lula, de ser brasileira, da desigualdade social, da irritação que me dá em ver que a cada sinal existe mais um menino jogando bolinhas em troco de moedas, da quantidade de dinheiro que se esvai pelos ralos de Brasília, das palhaçadas que nos acostumamos a ler no jornal. Reclamo porque leio o jornal e acho o ser humano cada vez mais escroto. Depois reclamo, pois se parar de ler o jornal e me fechar no meu umbigo talvez eu me torne tão escrota quanto. Reclamo da Telefônica que me cobrou o speedy duas vezes, reclamo da minha conta de celular que veio alta demais, reclamo da minha conta do banco que não sai do vermelho. Reclamo porque fiz cinco anos de faculdade e estou desempregada, reclamo da OAB que não solta o resultado do exame e posterga a minha indecisão profissional, reclamo porque tudo isso me consome o bom humor, o otimismo e alguns sonhos. Reclamo porque eu fui fazer direito e não publicidade e só li coisas chatas e escolhi uma faculdade muito chata para fazer da vida. E reclamo porque não tem mais faculdade para reclamar. Reclamo porque está na hora de virar gente grande e eu não sei nem por onde começo. Depois reclamo porque queria começar virando gente grande pela Terra do Nunca, mas ai já é tarde demais. Reclamo porque a passagem de ônibus esta cara e quem sabe se eu guardasse o dinheiro e só andasse a pé eu comprava logo um carro! Depois reclamo que com um carro eu só faria mais poluição e trânsito e São Paulo já esta cheia disso. Reclamo de São Paulo. Reclamo das suas ruas, do seu excesso de gente, da sua incoerência. Depois reclamo por amar esse caos todo e não conseguir ir embora. Reclamo do cinismo dos meus ex namorados, do cinismo das relações e porque o amor também é feito de reclamações. Reclamo porque tenho saudades de coisas que já foram e que não vão voltar. Reclamo por me lembrar de coisas que já deveriam ter ido. Reclamo dos meus amigos que me esqueceram em suas agendas telefônicas. Depois reclamo que qualquer encontro, com qualquer amigo, me forçaria a reclamar muito mais. E isso me faria voltar para casa sentindo-me pior. Reclamo, mas acabo sempre pedindo a cerveja mais barata, pois depois de quatro garrafas, eu esqueço de reclamar. Mas reclamo no dia seguinte por acordar de ressaca e com uma vontade louca de fazer xixi em todo lugar. Reclamo porque a Coca Cola lançou uma tal de Coca Cola zero, para substituir a Coca Light , mas tem tudo o mesmo gosto. Reclamo de tudo o que tem o mesmo gosto. Reclamo porque o mundo não me basta e eu sinto uma vontade incontida de olhar para tudo, mudar tudo, mas como eu não posso, não me resta mais do que o direito de reclamar. Reclamo porque há dias atrás o alemão ganhou um milhão no big brother e eu to aqui, vendendo almoço para comprar janta. Depois reclamo porque eu não tenho coragem de botar silicone dos peitos, tingir meu cabelo de loiro e enfrentar uma maratona num zoológico humano chefiado pelo Pedro Bial. Reclamo porque não vim ao mundo portando um belo par de peitos, reclamo porque não existe maior ilusão no mundo do que creme anti celulite e reclamo porque fico de TPM. Reclamo porque não consigo terminar esse texto de tantas coisas que tenho para reclamar. E daqui a pouco vou reclamar porque perdi o tesão de escrever.
Reclamo porque choro quando escuto o Bill Evans tocar. E reclamo porque poucos fazem música boa feito o Bill Evans.
Reclamo porque o que corre junto do meu sangue é inquieto e às vezes eu não consigo simplesmente me conformar.